sábado, 6 de dezembro de 2014

ALUNOS HETEROGÊNEOS PEDEM DESAFIOS ESPECÍFICOS

Disponívelhttp://revistaescola.abril.com.br/blogs/eja/2014/11/25/alunos-heterogeneos-pedem-desafios-especificos/

 | avaliaçãocomportamentosala de aula
Crédito: montagem/shutterstock
No post anterior, apresentei um dilema muito comum nas classes de EJA: os conflitos gerados pela diferença de ritmos e de assiduidade entre os alunos. Muitos professores sentiram-se provocados a discutir o assunto e, a julgar pelos comentários feitos nas redes sociais e aqui no blog, essas diferenças não estão restritas à Educação de Jovens e Adultos.
De fato, a heterogeneidade está presente em qualquer situação que envolva seres humanos, e quem espera a uniformidade não deveria trabalhar com pessoas. Não adianta almejar que todos os alunos sejam iguais quando sabemos que eles não são. Existem diferenças de interesses, expectativas, habilidades, ritmos, entre muitas outras coisas. Em vez de negar essa realidade – que não vai mudar –, nós, professores, deveríamos assumi-la como ponto de partida e, mais que isso, aproveitá-la para potencializar o trabalho em sala de aula.
Seguindo esse ponto de vista, separar os alunos por desempenho se mostra pouco produtivo e antidemocrático. É preciso pensar em práticas pedagógicas que tirem proveito da variedade de que dispomos e que incluam em vez de discriminar. Mas como fazer isso?
Uma primeira saída é enxergarmos a Educação para além dos conteúdos conceituais e assumirmos que a escola também é espaço para desenvolver outros aprendizados, como a tolerância e a convivência, tratando-as como conteúdos a serem trabalhados em grupo. Isso não deve ser feito de maneira acadêmica, expositiva, com o professor explicando o que significa convivência, mas com os estudantes, de fato, convivendo.
Para ilustrar essa ideia, imaginemos um trabalho de pesquisa em grupo sobre o tema Diabetes. Existem, é claro, todos os conteúdos envolvidos e que desejamos que os alunos aprendam, a exemplo da função do pâncreas, do que é glicemia e do que é insulina. Porém, isso é apenas parte da tarefa, pois também queremos que eles conversem, realizem a pesquisa sem brigar, dividam as funções de maneira harmônica e se ajudem. Tendemos a valorizar demais a porção conceitual do trabalho, avaliando se chegaram às ideias academicamente aceitas, mas em grande medida ignoramos toda a interação que a pesquisa envolveu. Essa porção é bem mais difícil de avaliar.
Já que separar os alunos não é uma opção, vou contar como eu faço para lidar com as diferenças de ritmos e perfis em minhas turmas: com desafios específicos para cada estudante. Para isso, proponho uma tarefa clara e que esteja ao alcance do aluno naquele determinado trabalho. Por exemplo, para um digo que o desafio é revisar seu texto e evitar os erros de acentuação. Para outro, peço que relacione os conceitos. Para um terceiro, solicito que inclua a experiência dele de fora da escola no trabalho e assim por diante.
Com essa estratégia, minha intenção é que a atividade seja sob medida para cada perfil, ou seja, desafiadora, mas atingível. Dessa forma, é possível incluir outros objetivos além dos conceituais e fica mais fácil avaliar o desempenho da turma de maneira mais individualizada.  Também fica mais claro para o estudante o que se espera dele, fazendo-o observar seu próprio percurso e o que falta avançar. Esse procedimento, é claro, exige um conhecimento mais detalhado das turmas.
Para continuar no exemplo do post anterior, tanto a aluna rápida faltosa quanto a lenta assídua têm coisas a aprender na escola. Em uma situação que enfrentei recentemente, propus à estudante de ritmo mais lento que ficasse responsável por redigir apenas uma das respostas que o grupo deveria dar, enquanto os colegas fariam outras tarefas. Assim, disporia de bastante tempo. Isso diminuiu a ansiedade dela, que pôde seguir em seu ritmo para finalizar a redação. Do ponto de vista conceitual, não atingiu completamente o esperado, entretanto, houve um progresso inegável em termos de autonomia.
Com a rápida faltosa, tive uma conversa franca. Esclareci que suas ausências desestabilizavam o grupo, mas que percebia que ela compreendia rapidamente os conceitos envolvidos na pesquisa. Seu desafio, portanto, não poderia estar no campo conceitual. Para ela, a encomenda foi tentar faltar menos e organizar as tarefas do grupo no computador, buscando ensinar os colegas em vez de fazer por eles. Essa aluna mostrou-se mais comprometida nesse trabalho do que em outros e foi elogiada pelos demais por sua postura.
Nesse contexto, as duas alunas eram do mesmo grupo e ambas foram avaliadas positivamente nos aspectos em que progrediram, mas não deixei de sinalizar que existiam pontos a melhorar. Mais do que uma nota, as estudantes receberam uma devolutiva que as fez observar o percurso delas e apontou caminhos para avançarem.
Para elas, nesse trabalho em particular, minhas encomendas funcionaram. Não sei se funcionarão em um próximo. Usando um chavão docente: não existe receita. O que existe é reflexão e ação.
E você, professor, o que pensa sobre isso?
P.S.: Devo a outros professores a reflexão que resultou neste post: Pato Papaterra, Alexander Christianini, Cristiano Nogueira, Rodrigo Mendes, Sandra Souza, Cristiane Magnani, Ana Paula Nunes e vários(as) outros(as). Todos os comentários, muito pertinentes, ajudam a (re)pensar esse dilema da heterogeneidade dos alunos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário